9 de dezembro de 2008

Quarta-feira

Era uma quarta-feira. Guto não gostava de quartas-feiras. O único dia que ele acordava mal-humorado era quarta-feira. Entrou no ônibus e não desejou bom-dia ao cobrador que sempre lhe devolvia o troco com um sorriso no rosto. A menina que sentava todos os dias ao seu lado já percebera que quarta-feira não era o dia preferido de Guto. Não puxou conversa com ele aquele dia, como sempre fazia. Aquela quarta-feira ele parecia estar ainda pior. Guto chegou ao trabalho, ajeitou uns poucos papéis em cima de sua mesa e começou a trabalhar. Enfiou o Garfield de pelúcia que fica em cima de sua mesa na gaveta, não estava afim de olhar para o sorriso do gato gordo. Guto era jornalista, sempre escrevia os melhores textos sobre ecologia e gastronomia. Mas naquela quarta-feira não conseguiu escrever nenhum. Sorte que sempre tinha alguns guardados, nos dias que estava bem parecia uma máquina, escrevia muitos textos muito bons. Passou a manhã toda sem falar com ninguém, sem fazer uma piadinha, uma ironia sequer. Chegou a hora do almoço e ele saiu para almoçar sozinho. Foi no restaurante, o prato do dia era feijoada. Guto odiava feijoada! Resolveu que iria comer nada, uma voz lhe dizia que tinha que se alimentar, mas outra dizia que não. Era uma voz irada que falava isso, e como Guto não gostava de quartas-feiras e aquela era ainda pior, resolveu ouvi-la o dia todo. Depois de não comer e voltar ao trabalho, decidiu que estava cansado demais. Apoiou a cabeça em sua mesa e dormiu. O chefe viu e, naturalmente, foi pedir explicações. Guto ouviu a voz irada novamente e, o sempre tão calmo e gentil Guto, xingou seu chefe. Falou tudo o que todos os funcionários tiveram vontade ao menos uma vez na vida de falar para o homem gordo e grisalho que estava ali na sua frente parado, com um semblante sério. O chefe ainda tentou conversar, sabia que seu melhor jornalista não era assim e que só poderia estar acontecendo alguma coisa para justificar aquela cena. Mas Guto não quis. Continuou a xingar, levantou da cadeira e foi embora. Os comentários após a sua saída foram os mais variados. Desde que ele poderia estar usando drogas até os que gostaram de sua atitude e pensavam em repetir. Mas foi no dia seguinte que os comentários tomaram conta da empresa, ninguém mais trabalhava, todos falavam do pobre Guto. Alguns diziam bem-feito, outros mais piedosos lembrava como era eficiente e educado, na maioria dos dias. Todos comentavam do acidente fatal em que um caminhão atropelou um jovem rapaz. Era uma quarta-feira, Guto odiava quartas-feiras, e odiava ainda mais aquela.

4 comentários:

marcela dantés disse...

que delícia abrir o blog da gente e ver um comentário tão delicado.
e que delícia abrir o blog da dona do comentário e ver tanta coisa boa de ler.
adorei.

obrigada pela visita.
você é sempre bem vinda lá no vontade.
e espero que eu seja aqui, porque pretendo voltar!
=P

beijos

. disse...

Mari, você é boa. Gostei bastante. :)

elas são disse...

oie.
nossa, nuna tinha entrado em seu blog. A primeira vez e já gostei.
Você escreve muito bem, dá vontade de querer ler mais e mais.
Muito bom!

bjos
Milena Nepomuceno

C disse...

Ah, que triste :\