Ele não gostava de ter muitas roupas preferidas. Senão, qual iria colocar no dia em que morresse? Já era hora de pensar nessas coisas, nesses pequenos detalhes da morte. Ficava desejando uma morte bonita, poética, digna de Drummond (ou quem sabe, Mario Quintana). Numa noite qualquer sentiria um arrepio, entenderia. Sentaria em sua mesa de madeira, que continha um notebook pequeno, uma amada máquina de escrever, mas iria preferir, sem dúvidas, a caneta e o papel. Se colocaria a escrever - seria o dia mais inspirado de sua vida, e deixaria uma carta a cada um de seus queridos. A especial seria de Miguel, o neto perceptivelmente preferido. Já tinha ouvido qualquer coisa que não devia ter (ou pelo menos demonstrar que tinha) um neto preferido entre os dezesseis. Mas achava uma grande bobagem isso, Miguel era sim o que mais lhe alegrava. Tinha um sorriso bonito, era engraçado e bondoso. Ia colocar numa carta ao advogado que primeiro trouxesse o neto para sua casa depois do enterro, e dissesse para que ele escolhesse tudo o que lhe agradasse, para que se lembrasse sempre do vô. Depois deitaria em sua cama e nunca mais acordaria.
Seu Juca era assim mesmo, planejava muito e dormia pouco. E quando já estava tomando seu café da manhã bem cedo, o telefone tocou. "O que? O Miguel não. Como?" Seu Juca caiu, duro, morto pela manhã. Com o coração parado de repente. Foi enterrado de pijama ao lado do neto Miguel.
5 comentários:
meu deuus, eu arrepiei inteira :X
Muito Lindo.
Como cabe tanta idéia dentro dessa sua cabecinha, Mari?
Ai, que triiiiiste ;-;
adorei !
eu tô chorando, mari.
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