11 de janeiro de 2009

Maria

Lavadeira. Lavadeira, dona-de-casa e mãe. Essas três funções já enchiam o dia, e a vida, da mulher.

Lavava as roupas de sua família e também da família que vivia na parte alta da cidade, recebia, mesmo que não muito, por isso e era assim que se sustentava. Cuidava da casa que era bem pequena e simples, tinha sempre o chão brilhando e as coisas em ordem. Era mãe de quatro crianças, três de seu ventre, uma de uma prima que engravidou muito nova e pediu ajuda nos primeiros meses, passou o tempo e deixou a menininha lá.

Morava na parte baixa da cidade, parte pobre. Lavava as roupas de marca de outra família, enquanto suas crianças vestiam pequenos trapos. A pequena casa era sempre limpa, a mulher cozinhava surpreendentemente bem, aprendera com a avó, sua comida não era cheia de temperos, mas nem de longe era insossa. Ao todo amamentara dez crianças, era comum isso. A mãe biológica não tinha leite o bastante para matar a fome do bebê, mulheres doavam um pouco de seu tempo e davam de mamar para filhos de outras, que acabavam por se tornar um pouco seus filhos também.

Lavava as roupas na mão, nem sabia como funcionava um máquina de lavar, ouvira falar na televisão, pensou que era lorota. Onde já se viu, uma máquina que lava roupas sozinha? A comida vinha do quintal de casa, mandioca, batata, feijão, salsa, tomate, couve-flor, agrião, rúcula. Pouco era o que a mulher comprava na venda do seu Lucas. A mulher, que era ainda muito jovem, só pariu menino. Um atrás do outro, quando o caçula tinha três meses chegou a princesinha da casa.

Os meninos eram filhos de um zé-ninguém que foi casado com a mulher. Não merecia nem um terço do que a pernambucana era. Homem encrencado que foi a vida inteira, morreu por uma bala que até hoje não se sabe da onde veio.

A mulher acordava cedo todos os dias, arrumava a casa, dava de comer para as crianças e já ia lavar sua roupa. Era feliz e vivia a cantar, os filhos brincando no quintal em volta dela. Preparava o almoço e dava banho nos pequenos, três horas da tarde já estavam na Igreja.

Agradecia, todos os dias, ajoelhada diante da Virgem. Agradecia pelos filhos, pelo emprego, pela casinha que tinha, pela alegria constante. E pedia, rogava por ajuda, para ter força para continuar. Se sentia um pouco Maria também, não virgem, mas Maria. Assim como muitas que batalham na vida e aprenderam a não cair e, se cair, a levantar com toda a dignidade que a mulher tem.

Para ela - ser mulher, é ser um pouco Maria.

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